Categorias
Crônica / Conto

E O CARNAVAL?

Enquanto começo a escrever este texto, ouço na TV uma matéria (mais uma das tantas) que falam sobre o mais novo ditador no planeta, o aloprado que voltou a presidir a nação conhecida como a “maior democracia do mundo” (entre aspas mesmo). É repugnante cada fala desse personagem! Mas, antes que o texto resvale para mais um indignado e infrutífero desabafo, e antes que eu perca o fio da meada, volto meus olhos para a tela e opto falar sobre o carnaval.
O carnaval, uma das maiores festas populares do mundo, sempre gera debates e polêmicas. Alguns mais radicais e menos esclarecidos, apegados a ideias anacrônicas e preconceituosas, e, geralmente, adeptos da teocracia, costumam taxá-lo como algo diabólico e contraindicado para pessoas “de bem”.
Importante dizer que aqueles que costumeiramente rotulam dessa maneira a arte do carnaval o fazem embasados naquilo que trazem dentro de si, como preconceitos e crenças equivocadas, e também em análises obtusas e rasas.
Em qualquer evento, até mesmo em festas particulares, ou dentro de igrejas, acontecem atos que não deveriam acontecer, como crimes e atos de desrespeito. Em qualquer lugar em que houver seres humanos, há a possibilidade de acontecer algo repugnante. Não é o carnaval o responsável por esses acontecimentos, e sim a própria índole humana. Aliás, o carnaval costuma nos chamar à reflexão justamente sobre temas gravíssimos que atingem nossa sociedade na atualidade.
Podemos citar, como exemplo, os enredos das escolas de samba do Rio de Janeiro. Acompanhei alguns desfiles pela TV, e que festa maravilhosa, linda de se ver! Sambas-enredo de qualidade, conhecimento, informação, história! E os temas: a maior parte das escolas utilizou muitos elementos da cultura afro em seus sambas-enredo, e isso é importantíssimo na atualidade! Em tempos de tanta intolerância religiosa e preconceitos avivados pelos que qualifiquei como “adeptos da teocracia”, é vital levar aos tantos milhões de espectadores nacionais e internacionais a riqueza de sabedoria das religiões de origem africana e a história de seus orixás. É importante marcar essa presença! Assim também em relação ao tema da homofobia, tão presente em nossa sociedade e reforçada também pelo líder mundial ao qual me referi no início do texto. A escola de samba Paraíso do Tuiuti trouxe a história de Xica Manicongo, a primeira mulher trans documentada no Brasil, como uma forma de marcar presença na visibilidade do carnaval e trazer à tona esse tema, principalmente por ser o Brasil, há dezesseis anos, o país em que mais se mata pessoas trans. Outro tema, que carece ser profundamente pensado e que foi trazido pela escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel, é a tecnologia e os limites éticos e ambientais, a importância de que a tecnologia seja pensada sem deixar de lado a realidade de que a preservação da vida no planeta deve vir em primeiro lugar, além de tantas outras repercussões do excesso tecnológico nas novas gerações. Enfim, as escolas de samba expuseram para o mundo um vasto material sobre o qual toda a sociedade precisa refletir, segmentos que não podem se calar e que precisam firmar presença para que possam ser respeitados. E isso é muito positivo!
Viva o carnaval!!

Luciana G. Rugani
Pensadora e experimentadora da arte e da literatura

Compartilhe este Post com seus amigos:

2 respostas em “E O CARNAVAL?”

Muito bom, Lu! As escolas de samba desenvolvem a consciência crítica muito mais do que nas escolas convencionais que andam pra lá de alienantes…

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *