Paulo Cotias (*) O Sapateiro Antigamente, na minha rua, havia um sapateiro. Aliás, permitam-me melhorar a descrição. Era uma sapataria completa, porém, de propriedade de um sapateiro italiano. Por isso, não era dessas sapatarias atuais que apenas vendem sapatos ou como os variados marketplaces virtuais. Ali, você encontrava uma atmosfera diferente, como se escolher sapatos […]
Categoria: Crônica / Conto
CONTO DE AMOR
Rubem Fonseca – 1925/2020. Quando servi o Exército eu me tornei especialista em bombas. Sei fabricar qualquer tipo de bomba portátil, muito usada por terroristas. A bomba que eu estava fazendo tinha que ter efeito fulminante, para que a vítima nada sofresse. E antes da explosão, era necessário que fosse emitido um feixe de luz […]
A FEIRA
Paulo Cotias Tudo começava às cinco horas da manhã. O barulho dos caminhões chegando e descarregando as pesadas armações de madeira. A gritaria dos mercadores, em especial, um pitoresco vendedor de frutas cuja voz potente conseguia a façanha de ser ao mesmo tempo engraçada pelo conteúdo e irritante pelo horário. Era dia de segunda. E, […]
O FOGO EGOÍSTA
Luciana G. Rugani O morro verde arde em chamas.O fogo destrói a vida pujante,Bem como a vida latente.Observe a queimada ao longe.Ali, o retrato daqui.A ignorância, vestida de arrogância,Queima o que resta da admiração cega.O desprezo das entrelinhasQueima a alegria,Resta o cinza da dor, da apatia.O fogo egoísta, que a tudo consome,Reflete o ser que […]
MULHERES DETENTAS
João do Rio – 1881/1921. Quando entramos, algumas detentas lavavam a primeira sala, sob o olhar severo de um guarda. – Tudo limpo? – Saiba V. Sa que ainda não. – Pois apresse, apresse estas mulheres. O chão de pedra estava cheio de lama. A água suja escorria da soleira da sala em dois grossos […]
REFINARIA
Escrever poesia não foi uma escolha. A poesia se impôs na minha escrita devido a uma necessidade de me expressar por meio de imagens, recortes, melodias descompassadas, delírios. Acredito que a poesia é, também, lugar da criação e da desordem, da alucinação por meio da palavra, da invenção desinventada. Um grito de vida analógica contra […]
O TRAVESSEIRO DE LENNY BRUCE
Luís Fernando Veríssimo O cômico americano Lenny Bruce tinha um monólogo sobre pornografia e hipocrisia envolvendo os usos do travesseiro. Qualquer criança americana podia ver no cinema ou na TV um travesseiro sendo usado para sufocar alguém até a morte. Terror mesmo era quando o travesseiro aparecia numa cena como a que Bruce descrevia dramaticamente. […]
A CLÁUSULA DO ELEVADOR
Luis Fernando Veríssimo Porque eram precavidos, porque queriam que sua união desse certo, e principalmente porque eram advogados, decidiram fazer um contrato nupcial. Um instrumento particular, só entre os dois, separado das formalidades usuais de um casamento civil. Nele estariam explicitados os deveres e os compromissos de cada um até que a morte — ou […]
NÁDEGAS REDOLENTES
Luís Fernando Veríssimo Ela era irresistível quando acordava. Tinha até um cheiro diferente, que desaparecia no resto do dia. Um cheiro morno. Cheiro de leite morno, era isso. Com um inexplicável toque de baunilha. Mas ela acordava de mau humor. Quente, cheirosa, apetitosa e emburrada. Nem deixava ele beijá-la na boca. “Eu ainda não escovei […]
EXCESSO DE TRABALHO
Nelson Rodrigues – 1912/1980. Era um pai muito escrupuloso. Sabendo que a filha estava com um romance, não perdeu tempo: — tratou de saber, direitinho, quem era o namorado. Durante quatro ou cinco dias, andou de baixo para cima, de cima para baixo, fazendo sindicâncias. Aconteceu, sistematicamente, o seguinte: — as pessoas interrogadas sobre os […]