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Aprendendo amor e respeito.

Quando comecei a assinar as coisas que escrevia em jornal o editor chefe implicou com o tamanho do nome e sobrenome, ambos duplos. Demais! Sobrando! Não ficava bem. Perdia o impacto. Tomava espaço e outras tantas chateações, que enumerava sempre que o colunista dava a cara em alguma página, especialmente a página 2, aos sábados. Foi tanta aporrinhação que não teve outro jeito, e o sobrenome do meu pai, cortado e deixado de lado, como se fosse o cóccix, aquele osso remanescente de outra coluna, a dos primatas, nossos aparentados tão esquecidos.

Passei então a usar em tudo que escrevia apenas o Lopes, de família tão conhecida e reconhecida.

O Guia ficou lá adormecido, escondidinho, mas vez por outra doía, aquela dorzinha chata, pequena, persistente e incômoda, que vai roendo, mas incapaz de provocar um rompimento ou explosão. Quase um panarício! Era assim que sentia sempre que assinava algum artigo e quando convidado para falar, uma bobagem aqui, outra acolá, em alguma emissora de rádio.

Um dia, nesses períodos doídos, que se enfrenta ao longo da vida. Dia em que a carência do abraço é maior que qualquer coisa, fui almoçar na casa de um grande amigo do meu pai. Desses da vida inteira, que continuou amando, protegendo e acarinhando a família após a morte do amigo querido.

Nunca o vi levantar a voz generosa. Dava o seu melhor olhar para o outro e tinha imenso orgulho e prazer de estar entre os amigos. Morreu devagar, junto com os que foram desaparecendo. Não viu razões para continuar por aqui, sem uma boa conversa.

Terminado o almoço, um “camarão a casca e nó” de lamber os beiços, fomos pra varanda, aguardando o cafezinho, que Dona Yolanda estava passando na cozinha. Mal sentou, ele perguntou de supetão, contrariando seu modo de iniciar qualquer assunto devagarzinho, com todo o jeito.

– Fernando Luiz, por que você tirou o sobrenome Guia das coisas que escreve? Por acaso quer esconder seu pai? Tem vergonha dele?

Em vão tentei explicar os problemas no jornal, as chatices do editor chefe, da diagramação, inventei reclamação dos leitores e assim por diante. Verdadeiro rosário de desculpas esfarrapadas, que não convenceram o velho amigo, que sempre se pautou pela doçura, mas que naquela tarde tinha pimenta na voz.

– Ah Fernando, não leve a mal, nunca mais vou ler. É como se fosse você pela metade. Tirou o sobrenome do seu pai, do meu amigo, enquanto as lágrimas enchiam os olhos e desciam pelo rosto moreno e vincado.

Senti vergonha. Muita vergonha! Aquela dor do dia a dia ganhou corpo. Choramos juntos! O choro que não tinha acontecido no Cemitério do Caju, no Rio, porque não se tinha dinheiro para trazer o corpo do meu pai para Cabo Frio.

Nos abraçamos!

No sábado, a coluna política estava lá plantada na página 2 e assinada por inteiro, com nome e sobrenome compostos. E com um imenso orgulho!

Aprendi naquela tarde, com um homem muito simples, amoroso e generoso a ter respeito pelo nome e sobrenome que carrego.

Lopes da Guia

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