Cláudio Leitão
A banalização das notícias sobre casos de assaltos, estupros e assassinatos na nossa mídia local, mostra de forma clara e inequívoca que se existe uma variável social em nossa cidade que cresce sem parar é a violência urbana. Todos que se arriscam a dissecar a matéria, certamente, encontrarão várias razões para justificar tal fato. Fatores econômicos, sociais, culturais, migração de bandidos da região metropolitana do Rio, além de outros, quando analisadas dariam laudas e laudas de textos que não caberiam num espaço de leitura objetiva como é característico do universo das redes sociais.
Nesta oportunidade gostaria de me ater a um dos fatores que entendo ser um dos principais responsáveis por esta crescente onda de criminalidade em nossa cidade e que nunca é abordado pelos “nossos jornalistas” quando estão entrevistando as autoridades públicas municipais nos vários programas de rádio e TV: a questão do modelo de desenvolvimento adotado que dividiu a cidade em “centro e periferia”.
Evidente que isso não é uma característica apenas de nossa cidade, mas aqui esta dicotomia se acentua de uma forma muito evidente. Um núcleo urbano no centro, asfaltado, com infraestrutura, investimentos em alguns equipamentos urbanos, habitados pelas pessoas de maior renda. Do outro lado, uma região periférica, sem políticas públicas adequadas, ocupações irregulares, às vezes estimuladas por políticos “malandros” e um contingente populacional de menor renda, uma parte subempregada e outra desempregada que acaba virando massa de manobra no jogo político.
Ao longo de muitos anos, Cabo Frio, além dos recursos próprios, recebeu generosos recursos provenientes dos royalties do petróleo, cuja destinação principal deveria ser o investimento em infraestrutura, oportunizando um “plus” orçamentário que se usado prioritariamente nas periferias proporcionaria uma efetiva redução deste desequilíbrio econômico, trazendo como consequência mais justiça social. Decisões políticas equivocadas e corrupção galopante fizeram com que estes recursos fossem desviados de sua função, provocando desigualdades de oportunidades que levam estas pessoas que estão no limite da sobrevivência a buscar caminhos que transgridem a lei e a ordem: o caminho do crime.
Achar que apenas o aparato de enfrentamento policial vai resolver esta questão é um grande equívoco. Verdadeiros exércitos de reposição são gerados nesta fábrica de pobreza criada por este modelo. Morre um e tem pelos menos uns dez para a “substituição”. A falta de políticas públicas adequadas na educação, saúde, cultura e esporte geram estes resultados catastróficos que são esfregados “nas caras de pau” dos governantes, que sempre diante de tragédias se apressam em dizer que vão tomar providências, que com o tempo percebemos que não acontecem.
Ações pontuais não produzem resultados duradouros. Produzem apenas “melhorazinhas” que normalmente servem a um objetivo eleitoral de ocasião. A solução passa por uma transformação no modelo de gestão pública. Enfrentar a corrupção com uma ação efetiva de transparência total dos gastos públicos que permita a fiscalização por parte de toda a sociedade e não apenas a fiscalização “meia boca” feita pela Câmara.
Gramsci, nos meados do século passado já alertava em seus estudos sobre esta dialética (Centro e Periferia), apontando as suas futuras consequências com o crescimento das cidades. Combater a violência urbana com estes métodos e baixos investimentos no cidadão é “enxugar gelo”. Anônimos morrem todo dia, meninas e meninos são jogados covardemente na criminalidade e na prostituição, sob o silêncio dos maus governantes.
Alguns ainda gritam aquele velho slogan que diz “bandido bom é bandido morto”, mas isso é só para os bandidos pobres e moradores das áreas periféricas. Aqueles bandidos de “maior coturno” que possuem cargos públicos e moram em coberturas na Praia do Forte são poupados, e muitas vezes, tratados com reverência e como celebridades amigas. Apenas quando morre alguém famoso ou vinculado ao poder político surgem alguns gritos de indignação, mas os ventos da impunidade e do esquecimento arrancam a nossa esperança de dias melhores e mais justiça social.
Cláudio Leitão é economista e professor de história.