Paulo Cotias (*)
Tudo bem considerarmos a importância que ele representa em nossas vidas e a enorme facilidade na rapidez e na densidade do compartilhamento de informações que proporcionou. Mas nada me tira da cabeça que o tal do e-mail não tem a menor graça.
Já as cartas… Que experiência interessante! Não estou falando dessas que ainda chegam teimosamente em nossas residências. Meros espectros que trazem, quando muito, alguma coisa de útil como um cartão de banco ou um informativo qualquer. Geralmente, as cartas de hoje costumam ser arautos das más notícias, uma dívida, contas, multas, cobranças frias e insensíveis que ora entram em nossas casas, oram ficam por lá, perdidas na caixa dos correios, vítimas silenciosas das vias digitais que, aos poucos, também reivindicam o seu lugar.
Estou falando, sim, de cartas, aquelas que tinham o nome pomposo de correspondência, que os poetas apaixonados chamavam de missiva, os eruditos de escrito, os religiosos de epístola e os mais reservados, linhas. Uma carta começava a ser escrita no coração ou na mente ou nas duas juntas. Munidos da vontade ou da necessidade de achegar-se ao outro, passávamos aos costumes de ofício. Para isso, íamos às papelarias para nos abastecer de todas essas traquitanas.
O universo dessas escolhas era extenso. Os papéis sempre foram um caso à parte. Uns mais diretos e tomados pelo espírito da constância compravam logo um bloco cujas folhas pautadas, a cor e a textura se tornavam uma marca registrada do remetente. Outros se aventuravam pelas folhas temáticas, decorativas e havia sempre os que preferiam a simplicidade das folhas brancas ou daquelas pautadas que usávamos nos trabalhos escolares desse tempo. Para as meninas, no entanto, esse mundo da papelaria era mais instigante.
Quem de nós, povo das antigas, não lembra de possuir ou de uma amiga que possuísse uma daquelas pastas repletas de “papéis de carta”? Lembro das garotas levando-as para lá e para cá. A graça era exibir a coleção, trocar com as amigas, doar, receber, enfim. Alguns garotos também se aventuravam nessa seara, com os modelos que eram feitos especialmente para o segmento, com os heróis dos quadrinhos ou dos desenhos da moda. Eu era mesmo da turma do bloco. Achava elegante a tal constância das folhas acastanhadas e das linhas marrons.
Para escrever as cartas, as canetas e lápis também vinham em variedade. Quem curtisse uma nostalgia poderia achar as de tinteiro, de pena ou mais modernosas. Havia também as simples, as com pontas de tais diâmetros, as mais elegantes, prometendo mais solenidade para as letras e até mesmo as novíssimas e coloridíssimas canetas com tintas aromatizadas de tudo o que se podia transformar em cheiro. E por falar nele, quem nunca colocou algumas borrifadas de perfume na carta depois de escrita que atire a primeira pedra.
Sim, nesse tempo já tínhamos a concorrência dos telefones, mesmo que isso ainda fosse um luxo para muitas casas. O negócio mesmo era escrever, mandar postais, perguntar como vão, pedir notícias, dar notícias, declarar-se ao amor da sua vida, dar término a uma vida de amor, a uma amizade, talvez. Conhecer pessoas de outros lugares, outros países, pedir fotos de tudo isso. E como era charmoso o tempo de espera. Até por que rapidez mesmo era com os telegramas. Secos e sempre urgentes.
Pelos correios, ou entregue em mãos, as cartas tinham identidade, muito além do CEP.
(*) Paulo Cotias é psicanalista e escritor. Visite o site www.psicotias.com
Uma resposta em “CHEGOU UMA CARTA PARA VOCÊ”
Bom dia!
Lembro quando minha mãe escrevia( letra linda) para minha avó e quando recebia.