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O POBRE DE DIREITA

Não acho que seja tão paradoxal que uma pessoa pobre, trabalhadora, seja simpática ao espectro ideológico da direita. Entendo que essa lógica singular se baseia na forte influência da mídia, na falta de um processo educacional socialmente referenciado e no baixo nível de consciência política. Isso somado constrói o pensamento desses trabalhadores pobres que estão aí como “bois de carga”. Há também aqueles que se acham da famosa “classe média” que reagem a esta questão fazendo a velha confusão entre seus imediatos instintos burgueses e a baixa consciência de si mesmos enquanto indivíduos e classe social. Alguns, inclusive, se acham mais perto dos ricos do que dos pobres e viajam nesta “maionese”!

Não adianta a galera politizada ficar estupefata quando assiste eleição após eleição o dito povão votar preferencialmente na direita e sustentar bandeiras toscas e brutais mesmo contra seus próprios interesses. Percebo que a esquerda precisa mudar de postura e atitude política. Sair do discurso das pautas identitárias, mostrar que muitas delas não são de esquerda, são liberais e pós-modernas, fazendo parte das mudanças sociais e comportamentais que são normais a partir da evolução da história humana.

Penso que a esquerda precisa voltar a focar nas pautas econômicas e ali aproximar seus ideais com a rotina e os desejos desse trabalhador mais pobre. Mostrar que defende estes interesses populares de forma mais clara, tudo isso com um discurso de mais fácil entendimento. É necessário também combater com mais eficiência os discursos mentirosos daqueles “deputados cristãos e conservadores” que a pretexto de defender pautas como o fim do aborto, fim do “casamento gay”, identidade de gênero e afins, votam sistematicamente contra todas as medidas que possam beneficiar os mais pobres.  Os meios de comunicação oficiais não ajudam, as redes sociais de direita distorcem e esse trabalhador mais pobre não consegue enxergar e perceber esta armadilha.

Ser de direita é algo natural para quem nasce e vive na sociedade capitalista, pois não se pode esperar que o pensamento e a influência forte da mídia que estimula o tempo todo o consumo, não influenciem a forma de vida do indivíduo. O capitalismo, como modelo econômico, coloca todos em concorrência e uns contra os outros. O que vale é ter e não ser. Vida selvagem e muita competitividade, logo, pensamento e consciência também nesta mesma toada. O modelo capitalista de produção é colocado para estes indivíduos como um processo de naturalidade social desde o seu nascimento.

Logo, diante de tantas influências midiáticas, políticas e sociais, não há nada de estranho no pobre que é de direita. Extraordinário seria se fosse ao contrário. Como já dito acima, a este grupo é negado, de forma proposital, um projeto de educação libertadora e socialmente referenciada nos valores universalistas, humanitários, libertários e solidários. É lógico também que ainda neste grupo há focos de resistência, mas isso é só o começo da uma longa e tortuosa luta rumo a superação da atual forma de vida, do modo de produção e da distribuição da riqueza produzida.

O mundo vive hoje contradições em que a rotina de vida prática contraria a essência e a existência humanas. Pouca gente no planeta reflete sobre isso. O pobre de direita não tem “mecanismos e filtros” que possibilitem pensar sobre temas desta natureza. Superar estas velhas contradições e alcançar o patamar de uma nova humanidade é tarefa da esquerda socialista. Abrir os horizontes de uma vida autêntica e socialmente mais justa. Mudar o mundo que foi criado, e por consequência, mudar a sociedade. Esta seria uma tarefa histórica que daria propósito e sentido para a vida. O grande desafio é como cumprir esta tarefa sem estar no poder. Fica sempre aquela pergunta: Será uma utopia?

Pode ser, realmente é muito difícil responder a esta pergunta. Eu confesso que sonho com isso, mas não sei como seria possível fazer e resolver um postulado pensado por Marx que diz o seguinte: “Se o homem é formado pelas circunstâncias, será necessário formar as circunstâncias humanamente. Se o homem é social por natureza, desenvolverá sua verdadeira natureza no seio da sociedade humana”.

Luta que segue !!

Claudio Leitão é economista e professor de história.

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