
Não existe melhor lugar pra arrumar assunto que a rua. Diz à lenda que Rubem Braga, o mais festejado de todos os cronistas brasileiros, montou seu jardim suspenso, justamente para observar as ruas do entorno de sua cobertura, em Ipanema. De lá, enquanto regava as plantas, quando não entretido com Tônia Carrero, sua grande paixão, e os amigos, que não o deixavam, observava o que acontecia e no dia seguinte a crônica quentinha estava nas páginas dos jornais.
As nossas cidades são de poucas praças e bairros inteiros, sem nenhuma. Prefeitos as distribuíram por cabos, sargentos e tenentes eleitorais. Pior, as que existem são bregas, mal cuidadas, onde o verde praticamente desapareceu. Os políticos não circulam mais a pé. Cafezinho em pé no balcão só na campanha eleitoral e muito menos sentam em banco de praça para olhar, conhecer e conversar com as pessoas. Enfim, ouvi-las, inclusive receber aquela generosa espinafração. Como numa adaptação mal feita de George Orwell, em “1984”, eles nos olham através das câmeras de segurança, vidros “fumês” dos seus carros blindados e imaginam que nos conhecem pelas pesquisas encomendadas a preço de ouro, que nós pagamos.
A praça histórica de minha cidade é resumo do mau gosto e desleixo, fruto de inúmeras intervenções de urbanistas de shoppings. Apesar da degradação imposta à praça tradicional ela é cheia de vida, gente de todas as idades, principalmente estudantes, no final da tarde ocupam o lugar pra bater papo, namorar e fazer música.
É o espaço público, livre, onde passa gente de todas as cores, formas e conteúdos, que resiste e assim se torna mais acolhedora. Capaz de receber seu povo, que a tomará nos braços para fazer dela sua ‘Ágora’, no exercício pleno da liberdade.
- Manoel Lopes da Guia Neto