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Crônica / Conto

A PIRA DA CORRUPÇÃO

O Night Club, em São Cristovão, foi dos melhores acontecimentos da noite daquela pequena cidade querendo se transformar em grande: sempre duas bandas de estilos e ritmos diferentes. Lotava os dois andares da casa! Cerveja gelada, batida de limão e cachorro magro acompanhavam aquele “bate-coxa”. Vez por outra, a pedidos, o conjunto lascava o “miudinho”, que é pra quem tem gosto e sabe sambar como Paulinho da Viola e a Velha Guarda da Portela.

Muito duro, sem jeito deixava pra Babade, “amigo de fé, irmão camarada” a tarefa de fazer as firulas com as garotas e porque não com as coroas bem dispostas. Às vezes era tanta firula, que custava aos dois corrida até o ponto de ônibus mais próximo: fazia parte. Por sorte o motorista conhecia aquela dupla de tantos outros carnavais e noitadas.

No final da noite, quando ficava sem um tostão, voltavam pra casa a pé ou encontravam aquela carona piedosa e salvadora. Certas madrugadas, não rolava nada, nem carona e sem dinheiro para o ônibus o jeito era sair se arrastando, do clube até a Padaria de Seu Luiz, no centro da cidade. Um estirão! Valia a pena! A generosidade do português garantia no mínimo aquela média de café, com pão e manteiga na chapa. Quando, por sorte, aparecia o saltitante jornalista do único diário da região, a “saideira”, com mais uma e outra cervejinha, era coisa certa.

Nessa época, o prefeito tinha lançado perto da rodoviária, o Muro do Amor, terreno descampado que tinha uma baita árvore, consultório ao ar livre, onde ele atendia centenas de pessoas diariamente. Hoje é um prédio horrendo, modernoso, entre tantos que aos poucos transformam a cidade em uma miniatura da região metropolitana do Rio de Janeiro.

A política fervia. A população ainda se chocava com as denúncias de corrupção. Navegando na maré, o prefeito criou a “Pira da Corrupção” e anunciou que ali iria queimar e transformar em cinzas toda a corrupção da cidade. A “pira” propriamente dita era um enorme tacho, grande mesmo, que ficava no centro do terreno.

Quando no meio da madrugada a dupla viu aquele tacho iluminado, não resistiu à tentação. Pulou o “Muro do Amor”, tinha meio metro de altura, no máximo, juntou o que restava de forças, derrubou a pesada “pira” do pedestal e saiu correndo pela madrugada.

No dia seguinte, a manchete do único jornal trazia: vândalos derrubaram a “Pira da Corrupção”!

Manoel Lopes da Guia Neto.

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