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MARX, PT, LULA E BOLSONARO

Ao analisar o quadro social, político e econômico das últimas décadas no país, fico tentando imaginar o que o próprio Marx diria sobre o que fizeram com seus pensamentos e suas obras depois do seu translado para contextos totalmente diferentes na América Latina. Ficou muito complicado “entender” Marx nestes países, inclusive no Brasil, onde predominam os chamados “capitalistas de compadrio”, os “clientes teteiros do Estado”, os que vivem de conluio no jeitinho brasileiro e até do próprio socialismo “contaminado” com os excessos do patrimonialismo brasileiro. Isso fortaleceu a idiotice, o despreparo, a arrogância imbecil, o obscurantismo e a deficiência neuronal de Bolsonaro junto as massas populares acríticas.

Embora os petistas se recusam a admitir, o PT tem uma parcela de responsabilidade pelo surgimento do “fenômeno Bolsonaro”. Mesmo com os avanços sociais em suas gestões, seus governos abandonaram antigos ideais em nome de um pragmatismo de ocasião em que fizeram o “velho jogo da política tradicional”, modus operandis que o PT sempre combateu antes de chegar ao poder.

Financiamento de campanha com esquemas com grandes empresas, alianças não programáticas, presidencialismo de coalização com setores conservadores da sociedade, com políticos notoriamente corruptos, políticas neoliberais com banqueiros em postos chaves no Ministério da Fazenda e Banco Central, etc. Tentou servir a dois senhores: O mercado e o povo.

Uma combinação difícil para um partido que se dizia de esquerda. O mercado acabou ganhando mais que o povo. Todas essas mudanças tiveram a participação e foram endossadas por Lula, que inclusive em certa ocasião disse que nunca foi de esquerda e socialista. E nunca foi mesmo. Lula sempre foi um democrata e hábil negociador político.

As políticas compensatórias adotadas, típicas da social democracia europeia, produziram resultados na melhora da qualidade de vida da população, mas foram gradativamente sendo desidratadas. Faltaram políticas mais estruturantes. A estratégia foi emancipar a massa trabalhadora pelo consumo e não pelo fortalecimento da cidadania. Isso deixou espaço para a entrada do discurso bolsonarista, que associou religião com o falso combate a corrupção. Isso calou fundo e funcionou muito bem eleitoralmente, principalmente na classe média iletrada, conservadora e no lumpesinato da classe trabalhadora.

Precisamos parar com este papo furado que “carimba” segmentos da esquerda socialista que fazem críticas a Lula e ao PT, críticas políticas e respeitosas, de estar “a serviço da direita”. Penso que quem se afirmar de esquerda precisa reconstruir esta luta em cima de uma alternativa radical e popular, radical no sentido de mudar pela raiz, por fora deste modelo de governança apodrecido.

Neste novo governo o PT voltou com as mesmas composições anteriores, cedendo importantes parcelas de poder a notórios corruptos e representantes do capital financeiro, sob o discurso de que é o que permite a atual conjuntura. É preciso mais coragem para enfrentar todo este quadro. Lula precisa resgatar sua história e fazer a esperada ruptura com este modelo e trazer para esta composição todos os setores progressistas, mesmo que isso importe em riscos para a governabilidade. A recente proposta de isenção de IR aos que ganham até 5.000 reais é um alento.

Um dos legados negativos do PT foi aniquilar ideologicamente com centenas de milhares de ativistas de esquerda que hoje acreditam que a única saída possível é a conciliação de classes e essas tais “alianças pela governabilidade”. Este prejuízo tem uma dimensão devastadora, visando a criação de alternativas políticas futuras.

Para a alegria daqueles que apoiam o golpista, que infelizmente ocupou o Palácio do Planalto por longos 4 anos, e que nunca leram uma frase de Marx, um dos autores mais lidos no mundo, é que o marxismo aqui “segue passando longe” e não é de hoje.

Claudio Leitão é economista e professor de história.

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