
Sem qualquer ilusão na democracia liberal, Gramsci criticava duramente a esquerda que se permitia enganar com as garantias legais do estado burguês. Duas perguntas se fazem necessárias: Até aonde vão os limites da legalidade? Em que momento deixam de ser respeitados?
É difícil fixar qualquer limite, dado o caráter bastante elástico que assume o conceito de legalidade. Para qualquer governo toda ação que se manifesta no campo da oposição contra ele supera os limites da legalidade. Contudo, pode-se dizer que a legalidade é determinada pelos interesses da classe que detém o poder em cada sociedade. Na sociedade capitalista, a legalidade é representada pelos interesses dos donos do capital.
Quando uma ação busca atingir de algum modo a propriedade privada e os lucros que dela derivam, tal ação se torna imediatamente ilegal. No plano formal, a legalidade se apresenta de modo diversionista, já que a alta burguesia ao conquistar o poder concedeu igual direito de voto ao patrão e seu empregado. Assim, a legalidade foi aparentemente assumindo o aspecto de um conjunto de normas livremente reconhecidas e aceitas por todos os segmentos da sociedade. Uma doce ilusão que é admitida por muitos, inclusive pelos “pobres de direita” que pensam ter os mesmos direitos dos patrões.
Confundindo estas duas facetas, os ideólogos da democracia liberal seguem enganando por muitos anos as grandes massas populares, levando-as a acreditar que o tal sufrágio universal as libertaria de todas as suas mazelas. Nesta ilusão, desgraçadamente, não caíram apenas os míopes defensores da democracia liberal, mas também muita gente que se considerava e se considera marxista ou de esquerda. Muitos também acreditam que a emancipação da classe trabalhadora pode se realizar por meio do exercício soberano do direito ao voto. Nova doce ilusão!
Entretanto, a realidade do dia a dia tem destruído de forma inexorável todas essas ilusões. A realidade mostrou do modo mais evidente possível, que a legalidade só existe quando se concilia com os interesses da classe dominante. Vejamos alguns exemplos: A escravidão era legal. O apartheid era legalizado. O holocausto foi legalizado, o voto do analfabeto não era legalizado, além de outros.
Na sociedade colonial, e agora na sociedade capitalista, a legalidade sempre concilia com os interesses da realeza, da classe patronal ou dos donos do capital. Logo, legalidade é uma questão de poder, não de justiça.
Claudio Leitão é economista e professor de história.