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Crônica / Conto

FESTA DE CRIANÇA

Paulo Cotias (*)

Se existe uma coisa que foi ficando diferente ao longo do tempo é festa de criança. Houve um tempo que esse tipo de celebração era, pasmem vocês, na casa das pessoas. Nesse tempo os prédios ainda estavam começando a oferecer a modernidade dos playgrounds, coisa rara e, fato é, que o mais recorrente era oferecer a festa dentro de casa mesmo. É preciso, no entanto, fazer justiça. As festas nos “plays” também eram boas, sim. Praticamente uma extensão do que era feito dentro de casa, apenas com uma escala um pouco maior e, claro, um espaço mais generoso para as brincadeiras e danças. Mas, voltemos ao assunto.

Sempre desconfiei que existisse uma espécie de código oculto compartilhado por todos aqueles que promoviam uma festa de criança, seja ela feita pelos mais pobres ou pelos mais abonados. Isso por que independentemente do local ou da família, havia uma expectativa a ser cumprida e, de fato, o que a gente encontrava nos dava a certeza de que os requisitos eram sempre atendidos. Das memórias que eu tenho, a mais vívida era encontrar sempre nelas a vontade de celebrar e a vontade de receber. Sim, o importante era a presença como forma de testemunhar o privilégio da vida e compartilhar um pouco dessa alegria. Íamos sempre de bom grado.

Seguindo a liturgia, uma festa de criança necessariamente precisava ser farta. Independente do bolso ou da variedade, havia sempre a preocupação da fartura, mesmo que para os bem mais humildes isso significasse a partilha de um pouco mais do que se costumava ter. E todos saiam satisfeitos. Comia-se e bebia-se bem e essa era a principal preocupação de quem dava a festa. No cenário ideal, deveria haver sempre um excedente que, como mandava a tradição sagrada, era partilhado entre os convivas para que levassem um pouco mais dessa festa para suas casas, não apenas para os que não puderam comparecer, mas como um prolongamento, uma espécie de lembrança da alegria da partilha e da importância da presença.

Portanto, não era nenhuma falta de civilidade ou de educação sair dessas festas com sacolas, potes de sorvetes, vasilhas ou pratinhos cheios de salgados, acepipes, doces e um naco generoso do bolo onipresente. De quebra, uma lembrancinha e talvez uns balões de gás. Havia um respeito pelos painéis e outros artefatos de decoração. Não se mexia. Até por que alguns eram alugados e estavam ali apenas cumprindo com o seu dever até uma próxima festa.

Quando a festa era em casa, era comum que a cama do aniversariante fosse usada como um espaço solene para guardar os presentes. Ali, cada convidado era levado pessoalmente e achava-se um lugar ao longo dela para que tivesse seu lugar. E não importava o presente. Roupas, canetas, jogos, bonecas, bolas, lembrancinhas das mais simples aos presentes mais arrojados como os eletrônicos e bicicletas, não havia tanta distinção de importância. O valor era o ato e a importância era a presença. Pode até ser que algum presente mais espalhafatoso gerasse um burburinho aqui e ali, mas isso não fazia do conviva mais ou menos desejável.

O parabéns era o clímax. Era de bom tom a sua espera e o seu término também marcava a cadência do bom senso de ir embora. Tenho saudade desse tempo em que as festas eram para as crianças, as que tínhamos e as nossas que restaram adormecidas dentro de nós. Tempo no qual não se celebrava o exibicionismo e a futilidade, no qual a única preocupação era servir, partilhar e viver a inigualável experiência da reciprocidade.

(*) Paulo Cotias é psicanalista e escritor. Visite o site www.psicotias.com 

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5 respostas em “FESTA DE CRIANÇA”

Assim mesmo,no dia seguinte a sala cheia de guardanapos de bolo pelo chão, papéis de bala,bolas estouradas,alegria dos presentes,das fatias de bolo distribuídas,a importância da presença e o sentimento de pertencimento da amizade e carinho de todos

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