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E NÃO DEU ONDA NO FESTIVAL DE SURF

Luciana G. Rugani

Domingo passado (23), seria o início do festival de surf em Saquarema (RJ), porém o mar permaneceu tranquilo, sem ondas, e o início do festival foi adiado. Marcaram o festival, porém se esqueceram de combinar com o mar! Ou melhor, caso houvessem com ele conversado, poderiam tê-lo conhecido melhor e, consequentemente, saberiam que ele tem o ritmo dele, a vontade dele, e que o único que o manipula é o Poder Criador, a Energia Divina que, por sua onipresença, também não cabe em nenhuma personificação.
A imagem dos atletas, na praia, olhando atentos para um mar que, tranquilo e sem nenhuma vontade de se agitar, prefere brincar com pequenas marolas, prefere interagir com crianças ou com quem esteja também buscando paz e sossego, me fez pensar em como seria o mar caso ele permitisse ser manipulado pela vontade humana. Os seres humanos, acostumados a manipular e a controlar aqueles que a isso se permitem, ficam no prejuízo quando tentam o mesmo com a natureza. Podem até, de certa forma e, aparentemente, conseguir algum resultado, porém, lá na frente, acabam arcando com preços altíssimos e prejuízos muitas vezes irreversíveis. Entretanto, na convivência entre humanos, a situação é bem diferente: quantos impõem suas vontades, às vezes por meio da força, porém outras vezes por meio de uma inversão de ônus, inversão dos fatos ou inversão de culpa? Quantos manipulam os mais desatentos que tudo visualizam apenas na superfície e não conseguem enxergar as almas mais a fundo? Quantos de nós, por exemplo, vamos a algum lugar sem termos vontade de ir, apenas por imaginarmos que, se nos negarmos a ir, estaremos desagradando a alguém? Estaremos sim desagradando, porém apenas àqueles que, certamente, usarão isso como motivo para nos controlar. São os tão conhecidos “jogos emocionais”, conhecem? Quantos de nós ainda permitimos que nossa presença siga estimulando as atitudes daqueles que visam muito mais alimentar o próprio ego do que ter-nos de fato ao seu lado? Quantas vezes permitimos que nossa imagem sirva apenas para reforçar aparições de falsas alegrias? Se pararmos para pensar, veremos que são muitas as ocasiões em que permitimos a manipulação, ou o controle, do outro sobre nós, e nos esquecemos de aprender com a natureza, ou com as águas do mar. Os jogos emocionais nem sempre são fruto de planejamento, ou de uma vontade premeditada. Penso que, em alguns casos sim, porém frequentemente costumam ser fruto de imaturidade emocional ou até mesmo consequência de vivências sofridas nas quais os jogos emocionais serviam como estratégias de defesa em garantia de sobrevivência e, com eles, o indivíduo acostumou-se a conviver, como também acostumou-se a praticá-los. Percebê-los é fundamental, e ter atenção às reações que nos chegam após posicionamentos assertivos é um caminho para isso. Aqueles com um emocional mais bem trabalhado na questão evolutiva e mais amadurecido nos embates da vida, certamente terão mais entendimento em relação a posicionamentos contrários. Aqueles que verdadeiramente nos querem bem também têm mais chance de aceitar colocações contrárias, pois, ainda que tenham o emocional imaturo e propenso a jogos psicológicos, o sentimento verdadeiro do querer bem acaba funcionando como um antígeno, uma primeira quebra da barreira defensiva. É também essencial que treinemos e ampliemos nossa percepção para os jogos de manipulação social, que tantos estragos produzem em uma sociedade. São autoridades públicas com imagens criadas em cima de valores caros para uma população, imagens que não condizem, por exemplo, com atitudes de um passado próximo, ou imagens que contradizem a já conhecida personalidade própria, ou ainda imagens que buscam ignorar palavras ditas no passado, como se quisesse fazer crer que hoje se pensa diferente sobre algo, enquanto a linha prática de atuação mostra o contrário.
Por fim, sempre é válido lembrar das águas do mar. Ele segue sendo ele, com mais ondas ou menos ondas, com ressaca ou com águas calmas, independente de como querem que ele esteja, ou de como querem que ele se comporte, independente de como querem que ele acredite ou que ele não acredite. Ele hoje não participa da brincadeira de surf. Ele simplesmente não está com vontade, prefere curtir tranquilo esse dia de sol maravilhoso e esse céu azul que nele repousa sua tinta.

Luciana G. Rugani
Academia de Letras e Artes de Cabo Frio – ALACAF e Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA

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