Paulo Cotias (*)
Para vencer eleições acirradas e assimétricas é preciso estabelecer um discurso de amplitude e um programa bem estruturado e confiável de medidas. Atualmente, o campo de disputas se encontra no grande conjunto de pessoas que, conscientes ou não disso, se caracterizam como progressistas.
Sem uma leitura histórica capaz de contextualizar o termo, muitos o tomam contemporaneamente como sinônimo de pertença ao campo de esquerda. O progressismo nasce no seio do conservadorismo. Porém, a parcela desse conservadorismo ao qual possui maior aderência se concentra majoritária e prioritariamente nas questões relacionadas ao simbólico, ou seja, crenças, costumes e algumas tradições, quase todas elas estruturadas por uma doutrina religiosa, pelas formas sociais fixadas como desejáveis pelas diferentes burguesias em seus espaços de poder e influência ou pela combinação de ambas.
Já no campo das relações econômicas, políticas e sociais, os progressistas se mostram mais flexíveis. Nessa zona periférica, são capazes de estabelecer um sólido diálogo, uma construção de consensos sensata e composições cooperativas que garantam a sinergia necessária para a governabilidade e mantença de programas, ações e marcos legais significativos.
Isso mostra que progressistas e esquerdistas não são sinônimos, mas essas adjetivações não são antagônicas. A partir dessa compreensão, torna-se cristalina a disputa pelo espectro conservador-progressista, que comumente chamados de centro, cujo pêndulo oscila na curva do arco democrático entre a direita e a esquerda, mas que tende a se afastar dos extremos.
É um equívoco considerar que os progressistas estão automaticamente alinhados à direita e essa é uma importante afirmação para que a esquerda viabilize pontos de intersecção. Até porque a direita é um campo que tem sido capturado e engolfado pelo neofascismo brasileiro. Para impedir que isso também se estenda aos progressistas, a esquerda terá também que se ressignificar.
Para tal, não pode cair na tentação do sectarismo, da armadilha em aprisionar-se obsessivamente a questões de alteridade, do “conforto” topológico dos discursos que fracionam e isolam, do uso de uma radicalidade retórica e uma estética agressiva que se por um lado satisfazem ao personalismo fetichista, por outro afasta os progressistas e alimentam as narrativas oportunistas e manipuladoras do campo adverso. Isso não significa abrir mão dos valores, fundamentos e modos de fazer. Pelo contrário, oportuniza a construção de pontes, a derrubada de muros e a credibilidade traduzida em votos.
Trata-se de formar uma maioria pela qualidade da conquista. Não é uma tarefa fácil e os neofascistas tem ao seu lado as “vantagens” do seu modo perverso de fazer política, com todos os vícios e malfeitos que, de tão conhecidos, são desnecessários elencar. Por isso, para essa disputa, a esquerda não deve se igualar aos neofascistas. Jogar no seu campo é antecipar a derrota. Mas, também, não pode viver um jacobinismo anacrônico. Conquistar o progressismo é saber conviver e construir com ele. É a dica.
(*) Paulo Cotias é professor, historiador e psicanalista.