Luciana G. Rugani (*)
Algumas coisas são por acaso, outras são planejadas. Quando aguçamos nossa observação, preservando também a nossa memória, ou seja, sem esquecer o aprendizado e a história de como os fatos se sucederam, percebemos que muitas coisas costumam se repetir. Isso acontece, por exemplo, na história política dos países.
Uma coisa que observo e que vale destacar é o levantamento de certas bandeiras que, talvez por terem maior apelo popular, acabam sendo utilizadas como meio de direcionamento do pensamento e da vontade dos membros de uma sociedade. Há muitas pautas utilizadas assim, para as quais a discussão não tem como foco chegar a nenhum ponto final, mas sim conduzir o interesse da população para o direcionamento almejado. Pautas morais costumam ser utilizadas assim, porém hoje abordarei duas que, ultimamente, sempre vêm à baila em torno de dois anos antes das eleições presidenciais: a segurança pública e a previdência social.
O que acontece é que, em nosso país, os poderosos grupos financeiros sempre comandaram a agenda pública. E desse grupo fazem parte muitas empresas que não são, essencialmente, financeiras, porém costumam ser detentoras de porcentagens de participação na administração de bancos, de fundos de previdência, entre outros. Têm, portanto, interesses financeiros comuns com tais entidades, além de, costumeiramente, partilharem de pensamentos neoliberais que nunca têm como foco, nem nunca terão, o combate à desigualdade extrema de riquezas e seus efeitos nefastos. Segundo dados de janeiro deste ano, divulgados pela CNN, no Brasil esses grupos representam 1% da população e detêm 63% da riqueza nacional, portanto, com esse poder gigantesco, eles nunca veem com bons olhos um governo que trabalhe em prol da diminuição dessa desigualdade. E, participando desse grupo, estão também os grandes veículos da mídia que buscam informar a população. E, podem reparar, sempre começam a pincelar notícias e entrevistas sobre previdência social e sobre segurança pública. A questão da previdência está ligada aos interesses das instituições privadas que, como todos sabemos, querem pôr fim a muitos direitos sociais, como os direitos trabalhistas e previdenciários, para que, assim, a população se torne cada vez mais dependente de recursos das financeiras e dos bancos e para que o domínio dessas entidades sobre a população seja quase divino, o que impõe restrições cada vez maiores para que os mais desprovidos de recursos tenham melhores condições.
A questão da segurança pública é utilizada por ser um tema sensível ao apelo popular, afinal, qual cidadão não tem interesse em viver em um país mais seguro? Então os telejornais, especialmente os locais, começam a dedicar um espaço muito maior para notícias sobre violência e crimes. E não são matérias embasadas, que visam diagnosticar os problemas e trazer estatísticas legítimas e necessárias para a busca de soluções, mas sim matérias meramente noticiosas, propulsoras do medo e da insegurança. Sabemos que tais crimes como, por exemplo, assaltos e furtos, acontecem, infelizmente, todos os dias. Então, por que e para que o aumento do espaço cedido a esse tipo de notícias? Já foi noticiado que, novamente, a segurança pública será o tema central das eleições presidenciais de 2026, assim como foi em 2018, quando muitos eleitores, por medo, deixaram-se levar pelo direcionamento midiático desses grupos poderosos e elegeram aquela aberração que não realizou nenhum esforço em busca de soluções para o problema, muito pelo contrário, e ainda quase pôs fim à nossa democracia. Acontece que, hoje, esses grupos não têm interesse em um governo louco e ditatorial como o antecessor, mas continuam com suas preferências neoliberais e com seus olhares de lado para um governo com foco na diminuição das igualdades. Por isso, começaram a pincelar matérias tendenciosas sobre previdência social e aumentaram o tempo dedicado a matérias sobre crimes e violência. A segurança pública, infelizmente, é um tema muito utilizado pela direita para a disseminação de falsas soluções para um problema tão complexo, portanto utilizado apenas como isca para capturar o interesse da população para os seus candidatos. Tenho observado essa priorização da notícia violenta no noticiário em geral e as matérias que são trazidas como cartas de baralho que sempre se repetem. Essas matérias, se absorvidas pela população daquela maneira rasa e tendenciosa com que são abordadas, sem nunca trazerem a fala de estudiosos de vertente contrária à que eles defendem, serão, novamente, como foram no passado, o caminho para que esses grupos poderosos combatam qualquer outra possível proposta progressista e, portanto, garantam sua permanência no domínio de uma população cada vez mais desigual.
É importante sempre acompanharmos as notícias, mas com senso crítico, ouvindo também outras vertentes sobre determinado assunto e buscando os canais progressistas (geralmente na internet, pois, no Brasil, devido ao alto custo, não temos, ainda, a concessão pública de TV para grupos de pensamento progressista e não neoliberais). E, por fim e não menos importante, voltar à história, buscar na memória tudo que aconteceu, como se deu, qual os principais temas pautados naquela época, quais eram as tendências e pensamentos alardeados para convencimento da população, o que foi implementado em parte e quais os interesses ficaram para serem implementados em possíveis novas tentativas futuras. Vale lembrar que, para esse 1% que detém 63% da riqueza nacional, quase nada é por acaso, e quase tudo é planejado, quando se trata de lucros ilimitados à custa do acirramento da desigualdade social.
(*) Luciana G. Rugani
Academia de Letras e Artes de Cabo Frio – ALACAF e
Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA.