Fazendo uma revisão nos “guardados” do meu laptop encontrei este texto que escrevi em 2007. Comparando com as “sacanagens políticas” que acontecem nos dias atuais resolvi trazê-lo de volta para a apreciação de vocês, certo de que esta história escabrosa surpreenderá muita gente. Segue o meu texto abaixo:
É bem provável que Nelson Jobim, ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso e ex-presidente do STF, tenha desistido de disputar a presidência do PMDB neste ano, com receio (se é que ele tem este sentimento) de ver explorado seu crime confessado.
Também com receio de se ver metido em mais um escândalo, Lula tratou de mobilizar um esquema para se esquivar de Jobim que queria, pasmem, virar Ministro da Justiça do seu governo, assim que assumisse a presidência do partido que sempre interferiu fortemente na política brasileira. Não tinha nada de mais para um país que vive atolado na sujeira e na canalhice explícita, mas convenhamos, canalhice tem limites até para os calhordas.
Abaixo, está um artigo escrito pelo jornalista Sebastião Nery que ilustra o crime de Jobim como “jagunço de banqueiro” na elaboração da Constituição Federal em 1988. Na época, os políticos se calaram, e o pior, a mídia também se calou. Todo mundo sabe que os banqueiros “regam” de forma generosa as campanhas eleitorais e todos os espaços de mídia do país.
Segue o artigo do jornalista Sebastião Nery:
NELSON JOBIM
Essa história, contada em livro excelente, exemplar – “O Mandarim, História da Infância da Unicamp”, do jornalista e escritor Eustáquio Gomes, editado pela Editora da Unicamp, foi relembrada neste fim de semana, aqui no Rio, em um encontro de dirigentes do PMDB, quando alguém perguntou:
– O que é que o Nelson Jobim entende de PMDB para querer ser presidente do partido? Nunca foi do MDB, embora tenha se formado em Direito em 68, quando o MDB já tinha sido criado em 66. Durante 18 anos ficou fazendo sua advocacia e dando suas aulas lá em Santa Maria sem tomar conhecimento do MDB e de suas duras lutas enfrentando a ditadura e conquistando a redemocratização. Em 86, entrou no partido para ser candidato à Constituinte. Em 90, reelegeu-se novamente pelo PMDB. Mas bastou Fernando Henrique se eleger presidente, Jobim pulou fora e foi ser ministro da Justiça do PSDB e de lá, gratificado com o Supremo Tribunal Federal. De que PMDB o Jobim entende? O que ele entende mesmo é de fraude constitucional.
A CONFISSÃO
E foi então relembrada e recontada uma história escabrosa, que publiquei aqui no ano passado com as irrespondíveis provas da denúncia.
Em 2003, Jobim, já ministro do Supremo Tribunal, surpreendeu o país confessando sem pudor, no programa “Roda Viva” da TV Cultura de São Paulo, que na Constituinte, como sub-relator da Comissão de Sistematização (Redação Final), sub-repticiamente, sem ninguém perceber, “introduziu um inciso”, um dispositivo, não discutido, não votado e nem aprovado pela Constituinte. Era a confissão de uma fraude.
Perguntado, interpelado, cobrado pelo Congresso e pela imprensa, Nelson Jobim, negou-se peremptoriamente a revelar, a confessar que “inciso”, que dispositivo, ele contrabandeou para dentro da Constituição.
BENAYON E REZENDE
De repente o mistério acabou. Os professores da Universidade de Brasília, Adriano Benayon e Pedro Rezende, também consultores legislativos da Câmara e do Senado, pesquisaram, leram e reviram, uma a uma, as emendas apresentadas e as atas das sessões e descobriram o estelionato.
Aprovadas as matérias no plenário, o Regimento da Constituinte proibia que sofressem qualquer emenda de mérito capaz de ter conseqüência jurídica. Não era admitido requerimento de emenda de mérito. O parágrafo 3º do artigo 166 da Constituição foi aprovado no plenário e não foi objeto de emenda alguma, como não podia ser. Portanto, o acréscimo ao texto, na Comissão de Sistematização (Redação Final) foi enfiado na Constituição sem o relator-geral e nenhum líder de partido ter percebido.
A FRAUDE
O parágrafo 3º do art. 166, que o plenário da Constituinte aprovou, dizia:
– As emendas ao projeto de lei do Orçamento anual ou aos projetos que o modifiquem somente podem ser aprovadas caso:
I – Sejam compatíveis com o Plano Plurianual e com a Lei de Diretrizes Orçamentárias;
II – Indiquem os recursos necessários, excluídas as que incidam sobre:
a) dotações para pessoal e seus encargos;
b) transferências constitucionais para Estados. Municípios e DF”.
Entre o “a” e o “b”, aprovados pelo plenário da Constituinte, Jobim, na Comissão de Sistematização (Redação Final), introduziu um “b” e o “b” passou a ser o “c”. O “b” enxertado por Jobim acrescentou “apenas” isso:
b) serviço da dívida.
A SERVIÇO DOS BANQUEIROS
O professor Benayon se indigna:
– “A finalidade evidente do delito foi, a serviço dos banqueiros, enxertar na Constituição aquele “b – serviço da dívida”, já que as dotações orçamentárias para pessoal e para as transferências aos Estados, Municípios e Distrito Federal são óbvias. Jobim tirou do Poder Legislativo qualquer possibilidade de opinar ou decidir sobre os juros dos banqueiros”.
O brilhante e bravo relator-geral da Constituinte, senador e ministro Bernardo Cabral, confessou ter ficado estarrecido e indignado. Jobim traiu a confiança de Ulysses Guimarães, de Mario Covas, dele e da Constituinte toda. E é esse homem, capaz de tudo, que Lula e alguns “insensatos” do PMDB, como afirma Helio Fernandes, querem pôr na presidência do partido. “
Após a transcrição deste artigo do brilhante jornalista Sebastião Nery, volto e completo o meu texto inicial:
Aquela famosa frase que diz, “Este não é um país sério”, fica sempre ressonando na cabeça de todos os brasileiros. Como uma “sacanagem” dessa passou incólume na Constituinte? Por que nunca ninguém no parlamento brasileiro tentou corrigir essa aberração? Por que a grande mídia nacional se calou?
Não tem respostas. Os interesses escusos e inconfessáveis que sempre nortearam a política brasileira calaram este inacreditável e escabroso episódio.
Claudio Leitão é economista e professor de história.