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NA PRÓXIMA SEGUNDA…

O início da semana é interessante, especialmente quando solar, como se a vida recomeçasse sempre as segundas. Visão de aposentado, condição que promete se tornar cada vez mais rara, após as reformas prometidas por aqueles que costumam se dedicar a salvar a si mesmos a custa do trabalho e da dor dos outros.

Após domingo modorrento. Que domingo não é chato e morno? Tem sempre a segunda, o dia de sol que provoca inquietude, anima as canelas, que saem às ruas buscando gente e assunto. É dia pra bater perna?

Segunda é dia de trabalho, do pessoal da marmita, que acorda cedo e que em geral não pode se dar ao luxo de ficar nessas divagações típicas de quem não tem nada ou mesmo muito pouco a fazer.

Que tal aprender a diferenciar os andares, expressões e posturas de quem anda pelas ruas? Arrumar um posto de observação e providenciar aquela cara de paisagem, que finge observar tudo e não ver nada. É tranquilo!

Ninguém dá bola mesmo pra velho. Dá pra fazer alentado relatório sobre a condição humana dos passantes. O que não dá é pra cochilar e muito menos morrer. Como não se repara em velho, tem chane do pessoal só dar conta do corpo no dia seguinte. Não é de bom tom, até porque o morto pode não estar vestido e calçado adequadamente.

Conheci um senhor, amigo da família, que só dormia de camisa social branca, paletó azul escuro e sapatos pretos bem engraxados. Temia que a foice o recolhesse mal ajambrado, acabasse alvo de chacotas pelos presentes ao velório e chegasse ao portal para a vida eterna, talvez celestial, sem o traje, que considerava apropriado para a ocasião. Por sorte, glória ou azar imposto pelo destino Seu Geraldo morreu nu, embaixo de uma morena gordinha numa casa de moças não tão requintadas, nos arredores da cidade.

O caminhar tenso e apressado é a cara de quem vai trabalhar. À volta, com o rosto e as pernas moídas pelo dia, que penetra a noite. Às vezes incapazes de responder a um cumprimento, mínimo aceno, quando muito raramente são vistos e reconhecidos por alguém. Em geral a fome é grande, adentra ao estomago e ali se mistura ao cansaço rotineiro.

Do outro lado do tabuleiro, aquele que passa como folgaz criatura, pernas soltas, andar casual, capaz de alegrar-se de tudo e quem sabe com tempo para perceber os detalhes do mundo a sua volta.

A essa altura do campeonato, tento empurrar o jogo para a prorrogação, com a lombar impedindo qualquer aventura atlética, caminho fingindo despretensão. Doido para me aboletar em algum canto, minimamente confortável e encontrar algum amigo solidário, capaz de jogar conversa fora.

Na próxima segunda…..

Lopes da Guia

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