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SOBRE O ‘GUIA DOS CORNUDOS’

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Outro dia me referi numa crônica ao Guia dos Cornudos, livreto de François-Marie-Charles Fourier, que viveu no agitado período da Revolução Francesa.

É interessante que numa época de tanta inquietude e ardor revolucionário o escritor vanguardista aproveitasse a ocasião para com humor fazer crítica de costumes através de minucioso catálogo, elencando dezenas de tipos e comportamentos dos cornos e suas mulheres.

Não me arrisquei a desvendar os motivos de ter sido escolhido por uma querida amiga para receber, em plena Páscoa, presente, digamos curioso. Podia ter dado semelhante brinde ao marido, um maduro professor meio adoentado ao qual foi recomendado um veterinário, na tentativa de recuperação da quase eterna frouxidão das carnes e músculos.

Como não poderia deixar de ser a leitura do Guia dos Cornudos é deliciosa, até porque se consegue, com a devida paciência, encaixar todos os amigos, conhecidos e nós mesmos, nos modelos estabelecidos por Fourier. Eis alguns exemplos citados pelo autor:

– “Cornudo de prescrição – É o que se ausenta, fazendo longas viagens durante as quais a natureza fala aos sentidos da sua mulher que, embora, defendendo-se durante muito tempo, acaba assediada pela duração excessiva das privações é obrigada a aceitar o socorro de um vizinho caridoso”.

– “Cornudo corneta – É o que espalha ao público as suas lacrimosas confidências, precisando: ‘Apanhei-os com a boca na botija, meus senhores’.

– “Cornudo sonso ou camaleão – É o que se zanga com este Manual e me chama ofensor dos costumes, tartufo, sentencioso cheio de fórmulas e edificantes anedotas….”

O autor enumera 76 tipos de cornos e encerra magnífico com o ‘cornudo de repouso’ – É o casado com uma mulher tão feia que, nem ele nem os outros, a imaginam capaz de arranjar amante. Será este o caso que à mulher confere melhores possibilidades de um divertimento tranquilo, pois amantes há de encontrá-los sempre, mais não seja com liberalidades ou pelo capricho de alguns homens em gostar das feias.”

Após muitos apelos emprestei o livreto a obsequiosa e atenta leitura de vetusto amigo, passado dos setenta. Ao chegar em casa, libidinoso, se despiu, ficando apenas de cuecas frente ao implacável espelho e com os olhos marejados constatou e sentenciou: “você está uma merda”!

Sob o olhar judicioso e compreensivo da mulher!

Lopes da Guia

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