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O QUE SIGNIFICA “PROGRESSO” NA ATUALIDADE?

Luciana G. Rugani

Vivemos em uma sociedade rica de bordões e de palavras frequentemente lembradas sob um só significado, e raramente pensamos sobre elas. Utilizamos frases feitas e repetidas inúmeras vezes, sem nos atermos à variedade de conteúdo que podem representar dentro dos mais variados contextos. E assim costumamos ser como “estações repetidoras” dessas frases e até de lemas criados intencionalmente como forma de promover algo ou até pessoas. Quando se cria essa repetição em forma de bordões, vende-se uma imagem como se aquela fala, ou aquele objeto, ou aquela pessoa, bastasse para a obtenção de algo tão desejado. Pode-se também vender uma ideia baseada em um significado totalmente fora do contexto da realidade atual e que, para se promover, conta justamente com a nossa tendência de abraçar a ideia sem analisar o significado contextual das palavras utilizadas.
Quando assistimos, por exemplo, a uma entrevista em que o entrevistado refere-se ao aumento da altura de edifícios como consequência natural da chegada do progresso, podemos nos deixar levar por essa fala, como se fosse um raciocínio verdadeiro, ou podemos analisar o significado contextual das palavras e percebermos que o argumento falha ao se referir a um conceito ultrapassado de “progresso”.
Qual o significado de “progresso”? O dicionário diz “avanço”, “tornar-se melhor”, “evoluir”. E o que seria “evoluir”? Há séculos atrás, quando a sociedade era ainda muito primitiva, o crescimento das edificações, o desmatamento, o asfaltamento sem critérios, tudo isso representava enorme progresso e evolução. Cidades inteiras cresceram rapidamente, progrediram. Entretanto, hoje, em um contexto totalmente diferente daquele do passado, em que as cidades estão carentes de natureza e as pessoas têm problemas de saúde física e de saúde mental em razão de uma vida sedentária, passando grande parte do dia em escritórios fechados e em tráfego intenso em seus retornos aos lares, a palavra “progresso” ainda teria o mesmo significado contextual do passado? Hoje, quando precisamos preservar áreas à beira-mar, por exemplo, preservar sua vegetação e sua fauna marinha, aumentar a altura das construções nessas regiões significaria “progresso”? Ou não seria, na verdade, um retrocesso? Afinal, não estaríamos retrocedendo a nossa qualidade de vida? Vemos isso na atualidade. Quantas doenças do século passado, que nos pareciam extintas, acabam voltando novamente em forma de epidemias? Não estaríamos, então, retrocedendo em relação à qualidade das condições de vida ao prosseguirmos no mesmo entendimento de “progresso”? O que significa “melhorar” no contexto atual?
Outro exemplo: se temos, na atualidade, carência extrema de ética, de empatia e de dedicação coletiva, se temos valorização exagerada de ganho fácil, com excesso de atitudes enraizadas na ambição desmedida e no falso entendimento de que o que é público a ninguém pertence, portanto quem dele toma conta pode dele apropriar-se, o que significaria “progredir”, “melhorar”, “evoluir”, dentro desse contexto?
A sociedade muda, os conceitos se transformam de acordo com a transformação da sociedade. Seria bom e muito útil analisarmos o significado contextual das palavras que ouvimos ao invés de, simplesmente, repeti-las. Afinal, evoluir, melhorar, aprimorar e progredir só será possível se a ideia que se vende baseia-se, de fato, naquilo que a sociedade carece para melhorar. De nada adianta falar em progresso e promover algo que vai em sentido contrário do que carece a sociedade. Aquilo que pensamos ser algo ultrapassado, pode hoje ser a saída para certo problema social. O ser humano pode caminhar como que buscando novamente suas origens para obter a solução de certa questão, e, para isso, pode contar com a evolução da ciência. Progredir, no contexto atual, é bem diferente de “progredir” no contexto de séculos passados. Tudo somente irá melhorar se houver escolhas sintonizadas verdadeiramente com o que de fato temos carência em relação à vida e à qualidade de vida para a sociedade como um todo.

Luciana G. Rugani
Academia de Letras e Artes de Cabo Frio – ALACAF e Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA

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