Luciana G. Rugani (*)
Esta semana começou com um fato lamentável e triste em nossa região e sobre o qual acho importante registrar minhas colocações: a demolição dos quiosques da Praia das Conchas.
Lembro que escrevi sobre isso quando aconteceu a primeira das demolições e quando surgiram os primeiros questionamentos sobre o fato. Sempre ouvíamos no ambiente regional: “isso é coisa da Justiça, área da Marinha, não nos cabe agir nesse caso”. Mas essa justificativa, por si só, não satisfazia, pois todos sabemos bem que, quando há vontade política, há conversas que geram acordos, plenamente legais, a serem realizados.
Em Belo Horizonte, recentemente, houve um episódio por meio do qual pudemos constatar essa realidade. O prefeito de BH, quando teve vontade política, foi até o governo federal e conversou sobre uma área onde, até pouco tempo, funcionava um aeroclube, pequeno aeroporto com frequentes ocorrências de acidentes aéreos nos bairros ao redor. O aeroporto foi desativado. A área é da União, o prefeito foi até lá, conversou e obteve a cessão gratuita de parte do terreno para o Município, onde deverão ser construídas unidades habitacionais e instalados equipamentos públicos. Esse fato, portanto, ilustra o uso de uma das modalidades de contrato administrativo como instrumento que permite o uso, por um ente federativo, de um imóvel pertencente a outro. Isso está previsto em nosso ordenamento jurídico, tudo foi realizado em conformidade com a lei, portanto algo semelhante poderia ter sido buscado, junto ao governo federal, em relação à demanda dos quiosques. O processo judicial arrastou-se por anos, sem que houvesse, de fato, vontade política para resolvê-lo.
Quando nos chega a informação de que já houve, e de que ainda há, grupos empresariais poderosos, até mesmo do exterior, que sonham em explorar e lucrar com uma praia elitizada, e de que há, em tramitação, um projeto grandioso de resort e clube aquático para o local, entendemos o porquê da inércia por parte do poder público por, praticamente, vinte anos (a demanda judicial teve início por volta de 2005). Certamente, optaram por “lavar as mãos” e deixar a questão correr judicialmente, assim favorecendo, de forma tácita, à especulação daqueles aos quais me referi, ao invés de assumirem postura em defesa do Município e de seus trabalhadores. Há um projeto para construção de novos quiosques no local, um pouco atrás de onde estavam localizados os antigos. Bastava que o poder público municipal houvesse buscado o governo federal para conversar e solicitar a medida administrativa de autorização do uso daquela parte do terreno com vistas à execução do projeto.
Mas, enfim, na segunda e na terça-feira, aconteceram as demolições. O atual governo municipal, após muita luta dos trabalhadores do local, permitiu o retorno do trabalho dos quiosqueiros para daqui a 40 dias, mediante a instalação de tendas, sob o argumento de que a situação está sendo adequada e reordenada como aconteceu na Praia do Forte (aqui abro um parênteses e paro um pouco de escrever pra lembrar os recentes e frequentes acontecimentos que mostraram a “organização” da Praia do Forte). Além disso, foi prometido também aos quiosqueiros que será proposto, ao governo federal, um acordo que permita a construção dos novos quiosques ali na parte de trás. Vale lembrar que, em havendo vontade efetiva por parte da prefeitura de buscar o governo federal, os ventos sopram favoravelmente, pois, em função da articulação junto à executiva nacional do Partido dos Trabalhadores – PT, a prefeita agora compõe a Federação Brasil da Esperança da qual o PT faz parte. Então, a meu ver, essa mesma executiva, juntamente com a prefeitura, têm agora o dever de providenciar o cumprimento dessa promessa, até porque trata-se de uma demanda justa com as cerca de 150 famílias que vivem do trabalho na Praia das Conchas.
Atuar em prol de uma solução justa, nesse caso, é atuar a favor do emprego e do fortalecimento do empreendedorismo social na cidade. Além do fato de que, por meio do trabalhador e do empreendedor local, há possibilidade de serem constituídas parcerias mais efetivas com foco no aumento da conscientização ambiental e de outras demandas sociais da população. Mas… são promessas… e de promessas em promessas, intermediadas por silêncios e inércias, a situação chegou à sua mais triste etapa. Fica a pergunta: agora, que os trabalhadores poderão, após 40 dias, exercer suas atividades, porém de forma muito mais precária, a promessa será, finalmente, cumprida?
Luciana G. Rugani
Academia de Letras e Artes de Cabo Frio – ALACAF e Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA