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O FASCISMO FOI UMA ESCOLHA

Ninguém que aderiu ao fascismo o fez por engano. Líderes fascistas, como Mussolini, seu ícone maior, jamais iludiram quem quer que seja sobre suas crenças e muito menos sobre as suas intenções. De fato, no seu devido contexto, o fascismo exerceu um fascínio perverso. Como insetos atraídos pelo brilho da luz artificial, vários profissionais liberais, acadêmicos e intelectuais, por exemplo, se permitiram conjugar a sua vaidade com as promessas do regime de que eles comporiam a elite pensante e governante, como patrícios de uma Roma recapitulada. Descobriram, ainda cedo, que seriam meras peças de propaganda e que o uso das suas habilidades serviria apenas para validar o contorcionismo ideológico do regime. Como não tiveram o lugar ao sol que esperavam, restou a vergonha e uma tímida retirada silenciosa, de volta aos anônimos bastidores da história. Porém, nada apaga a culpa de ter contribuído para o estrago.

Oportunistas e carreiristas também aderiram rapidamente quando viram que o fascismo era a bola da vez. Como produtos do meio, nunca tiveram dificuldade de pular de poleiro em poleiro quando farejam a oportunidade. Geralmente essas figuras são ótimos farsantes e adoram estar em evidência. Não se acanham em usar o nome de Deus se preciso for, de se mostrarem aparentemente piedosas, socialmente engajadas e muito menos se sentem desconfortáveis em usar a arte da bajulação mais rasteira como meio de costurar e publicizar as suas relações. Esses conseguiram resultados difusos no regime. Alguns conseguiram mandatos, outros cargos no governo, mas a maioria apenas protagonizou uma ópera bufa.

No fascismo muitos se revelaram. Os que sempre usaram de militâncias para obter cargos ou vantagens flertaram com o regime acreditando que seriam engajados. Mas o regime já tinha as suas prioridades e somente muita ganância pode explicar a razão pela qual lideranças sociais aderiram ao fascismo. Não há como sustentar que o fascismo manteria ou daria espaço ao que ele sempre prometeu combater com dureza e irracionalidade.

Mussolini sempre foi o que foi. Nunca escondeu. Aquele seu sorriso cínico, acompanhado do olhar evasivo, das falas teatralizadas eram o que eram. Sempre deixou cristalinas as suas crenças e intenções. O que pretendia exterminar, implantar e o como faria tudo isso. Portanto, quem aderiu, sabia o que viria pela frente e optou por participar acreditando que, ajudando a criar o monstro, ele talvez não o devorasse depois. Quem sabe até o recompensasse pela subserviência. O resto é produção narrativa covarde, mesquinha e pífia para justificar o injustificável: “eu o escolhi por que ele é um realizador”, “ele significa um novo tempo”, “ele é um grande articulador”, “com ele teremos espaço”, “ele vai fazer diferente”.

Mussolini arrastou a Itália para a barbárie. Para uma guerra infame. Para a desumanização. Acabou pendurado de cabeça para baixo em um posto de gasolina, linchado pelo povo e pela história. Já para os seus seguidores, era apenas uma quarta feira. Na quinta, já era preciso procurar em quem colar para se aprumarem novamente.

Tanto o fascismo de ontem, quanto o neofascismo atual foram questões de escolha. E quem escolher por isso, sabe muito bem o que está fazendo, ou seja, espera pessoalmente obter vantagens com ele e por meio dele. Só não podem depois bancar os inocentes e choramingar em outros colos quando as coisas começarem a ficar de ponta-cabeça.

Paulo Cotias é professor, escritor e psicanalista.

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